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Semana do meio ambiente e a boiada de Ricardo Salles
Por Sandra Caselato 02/06/2020 13h22
Nesta semana em que se comemora o Dia Mundial (5) e a Semana Nacional do Meio Ambiente, percebo que nestes tempos de quarentena o que eu mais sinto falta é o contato com a natureza.
A vida na cidade, morando num apartamento, já me deixa mais afastada do que eu gostaria de um contato mais próximo com as plantas, as árvores e o horizonte, e isso afeta perceptivelmente meu bem-estar, meu nível de estresse e ansiedade no dia a dia.
Consigo entender muito bem o sucesso que a prática do “banho de floresta” tem tido, se espalhando por vários países nos últimos anos, inclusive com indicação médica, devido a seus efeitos terapêuticos e de prevenção de doenças. Essa prática nasceu de pesquisas realizadas em universidades no Japão e consiste em passar tempo em imersão na mata, sem se preocupar com nada a não ser contemplar a paisagem.
De fato, eu me sinto mais relaxada, conectada comigo mesmo e centrada quando estou em contato mais frequente com a natureza.
Lamentavelmente, em algum momento na história da civilização ocidental, por volta do século 17, com o nascimento da metodologia científica clássica, começou a se estabelecer a ideia de que a mente é separada do corpo, o sujeito do objeto e o ser humano é desconectado do meio ambiente.
O pensamento dominante em nossa cultura e sociedade ocidental atual passou a ser de que somos indivíduos separados uns dos outros e do ambiente a nossa volta. Passamos a acreditar que somos de certa forma até mesmo separados de nós mesmos, de nosso próprio corpo, nossos sentimentos e necessidades. Cremos que somos prioritariamente nosso intelecto, nosso raciocínio lógico e objetivo. A consequência disso é que não vivemos nem expressamos todo nosso potencial humano nem em nossas vidas individuais nem coletivamente, na maneira como organizamos nossos sistemas socioeconômicos e culturais.
Como resultado deste tipo de pensamento, nossa sociedade se estrutura de maneira a priorizar o indivíduo em vez da coletividade, as coisas em vez dos seres vivos, o lucro em vez das pessoas. A natureza e o meio ambiente são explorados sem considerar o impacto e as relações sistêmicas entre a ecologia, a economia e a sociedade.
Então, acabamos desconectados de nós mesmos, das pessoas à nossa volta, do nosso ambiente, do nosso planeta, sem perceber que todas essas coisas são intrinsecamente conectadas e interdependentes.
É possível identificar claramente este tipo de pensamento em discursos como o de Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, que semana passada falou em aproveitar o momento de pandemia para “passar a boiada” nas florestas brasileiras, aumentando ainda mais a destruição ambiental.
A crença de que não somos parte de um todo maior não nos faz menos parte da natureza. Se considerarmos toda história da humanidade, este pensamento é na verdade bastante recente.
As culturas indígenas em geral ainda mantém uma visão de mundo em que os serem humanos são parte da natureza e a conexão com ela é fundamental para a vida humana. Para os povos indígenas, cuidar da natureza e preservá-la é cuidar de nós mesmos, já que somos parte dela e não sobrevivemos sem ela.
Felizmente, cada vez mais, a ciência ocidental está se dedicando a reconhecer a interdependência entre todos os seres e tudo que existe em nosso planeta e a resgatar o conhecimento e sabedoria de culturas ancestrais.
O conceito de desenvolvimento sustentável, debatido desde 1972 na Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, propõe o desenvolvimento ambiental das sociedades, aliado aos desenvolvimentos econômico e social.
“Desenvolvimento Sustentável é o desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações”. Portanto, é o desenvolvimento que não esgota os recursos naturais, buscando torná-los perenemente disponíveis. Reconhece a relação indissociável entre a ecologia, a economia e a sociedade.
Resta a conscientização mais ampla da população, dos líderes e governos mundiais para transformar a maneira como tratamos uns aos outros e ao meio ambiente.
Nossa interdependência com o meio ambiente é evidenciada na frase frequentemente atribuída ao Einstein “Se as abelhas desaparecerem da face da terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência. Sem abelhas não há polinização, não há reprodução da flora, sem flora não há animais, sem animais não haverá raça humana”.
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Imagem destacada: Poder360